terça-feira, 26 de outubro de 2010

Meio

Meio

Sou meio de cada coisa, de cada lugar, de cada pessoa. Sou meio meu pai, minha mãe, sou meio você. Sou meio Bahia, meio Sergipe.


Sou meio homem, meio mulher. Meio triste e alegre, meio verdade, meio mentira. Meio de ninguém, meio de um, meio de duas. Meio choro, meio riso.


Mas às vezes sou mais de um meio que um meio só. Sou mais noite que dia, mais chuva que sol, sou mais eu que você. Mais vinho que cerveja, mais você do que eu.



Mais sal que açúcar, mais feira que shopping, mais mar que cachoeira, mais dançar do que cantar. Sou mais amigos que amores, mais partida que chegada, mais rua do que casa.



Não dá pra ficar só no meio, nem no mais de que um meio, fico também no menos do meio. Caranguejos, Pedrinhas, cajús, cabruncos, oxentes, Itabuna, Rio, Maringá... um taco de mim em cada canto está. Aqui, ali e acolá.

Leila Oliveira











sábado, 9 de outubro de 2010

Lembra?

Lembra, amor? Quando a gente amanheceu nas escadas da catedral, tomando pedra noventa e fumando pacaia? Você ouvindo metal, e eu suportando aquele som irritante só pra te agradar, mas eu achava lindo a sua empolgação tocando guitarra invisível. Lembra, amor? Você precisa lembrar... tente lembrar.
Lembra, amor? O quanto me surpreendeu o tamanho daquele cravo, e eu fiquei louca para espreme-lo, você se recusava a deixar. Corremos a casa toda, eu querendo a todo custo eliminar o cravo, lembra? Ah, aquilo tirou a minha paz... mas no final você deixou, mesmo sabendo que ia doer, só pra não me contrariar. Sua testa ficou horrível com aquele calombo!
Lembra, amor? Quando procuramos algo pra comer? Estávamos quebrados(sempre quebrados) e só tinha um miojo? A divisão do miojo foi muito divertida, eu queria que a maior parte fosse pra você, você queria que fosse pra mim, passamos horas discutindo, e o miojo acabou esfriando e ninguém comeu.
Lembra, amor? Fazíamos amor a qualquer hora, se brincar, em qualquer lugar. Uma, duas, três... muitas loucuras. Quando você me olhava daquele jeito, como se seus olhos fossem me comer, eu arrancava a sua roupa e saía de mim.
Agora, saímos com nossas carteiras de cigarro, cada um com a sua, tomamos bons vinhos, vodcas, cervejas, frequentamos bons lugares. Você já não ouve metal com tanta frequência, ou quase nunca. Sempre concordamos com as mesmas coisas. Não precisamos decidir quem fica com a maior parte do miojo. Fazer amor sempre à noite, não em qualquer lugar, e duas ou três vezes na semana. Sim, tudo se tornou muito chato e monótono. Eu e você.
Você me propôs uma coisa e eu topei. Para relembrar o tempo em que estávamos no ápice da nossa felicidade, compramos um pacote de pacaia, uma garrafa de água ardente pedra noventa e fomos para as escadas da catedral. Sentamos. A escada estava pintada. Muita coisa mudou, assim como nós. Abrimos a garrafa, acendemos a pacaia, eu reclamei, você reclamou... a cachaça e aquele fumo estavam intragáveis, e nos perguntamos como conseguimos, um dia, beber aquilo. Eu reclamei do frio, você do silêncio. Não nos restou outra opção a não ser ir pra casa. Viemos em silêncio durante todo o caminho até em casa, nostalgicos, cada um com seus pensamentos. Já na porta de casa, você, rasgando o silêncio, se virou para mim e disse que aquele tempo não volta mais, que foi único e nunca se repetirá, de nada adiantaria sentar naquelas escadas esperando aquilo voltar. Não volta. O nosso tempo ficou lá atrás.
Ah, amor... lembra?
Leila Oliveira

sábado, 11 de setembro de 2010

Antes de dormir

Amor. Sempre representado pelos mais lindos desenhos, pintado com as mais belas cores, tecido por maravilhosas poesias e cantado pelas mais belas canções. Artes e manhas que logo irão nos envolver de novo, de novo e de novo. E quando eu pensei nisso estava tão enjoada, não sei se foi por tanto melo ou porque havia bebido um pouco além da conta, e meus dedos insuportavelmente fedidos a cigarro. Achei melhor ir dormir, era o que tinha de melhor pra fazer naquele dia, minha cama fria me esperava, o meu aparador de lágrimas esperava e o meu lençol de estampa de jornal americano me acariciava de uma forma tão terna, me senti tão confortável, e aos poucos o frio ia embora... E por fim adormeci, dormi tão bem. Mas isso só foi naquele dia, ainda bem.

Hoje não evito o que me lembre, e também não procuro lembrar, acontece. E eu sempre te encontro numa música, num cheiro, ou até mesmo numa dose de Campari, sua bebida preferida.
Também não espero, não espero por você, nem por qualquer outra coisa, porquê quando algo é nosso, simplesmente vem, bem clichê, mas é assim.
Tomada por um turbilhão se sensações, estive naquele momento antes de dormir.

Vou me permitindo aos poucos a novos beijos, a novos abraços, a novos nomes e a outros rostos. Vou me adaptando, ao que não vem e não é de você.

Leila Oliveira

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Romance no Pé de Siriguela

Havia um pé de siriguela e cinco meninas diante dele. Elas tinham uma missão muito importante: eleger um galho para ser seu namorado, dar um nome, escolher uma profissão e fazer planos de viagens internacionais... Estar com um galho de siriguela, não era apenas fazer planos, era beijar, abraçar esse galho com muito carinho, alternando com leves roçadinhas.
Então é chegada a hora da escolha, cada uma escolheria o seu. Foram aos poucos expondo suas preferências. Ana quis o galho mais grosso e longo, Beatriz um galho nem tão grosso, nem tão fino, porém curto. Helena não fez muitas exigências, quria um galho que fosse mais baixo, tinha medo de altura. Clara, nem tão alto, nem tão baixo, nem tão fino nem tão grosso, ela queria apenas namorar, era pra isso que estava ali. Já Laura, que era a mais sibite e saliente, escolheu um galho que estava no topo, era arriscado. Além de ser no alto era muito fino.
Depois de seus pretendentes escolhidos, deu-se início a "namoraderia".
Estavam ali com seus namorados e futuros noivos. Ana começou a abraçar e beijar o galho eleito, não demorou muito e já estava se roçando. Enquanto Laura lá do topo chamava a atenção das amigas dizendo com grande satisfação que o namorado dela era rico e influente empresário da região, afim de despertar inveja. Também não perdeu muito tempo, esqueceu de que o galho dela era o mais alto, fino e flexível e se pôs a beija-lo com azedume. Enquanto isso Clara perguntava ao namorado, que era médico, onde eles iriam passar a lua de mel, e gritou para as outras:Iu, abestalhadas! Nós vamos viajar para Nova Iorque. Laura nem se mostrou interessada no que Clara falava, ela queria mesmo era namorar, e o que se via era o galho sacolejar de um lado para o outro. Laura estava de veras descontrolada, deixando suas amigas um tanto assustadas com aquela cena. Ana se mostrou preocupada e alertou: cuidado Laura, vai ficar roxa! Laura ignorou o conselho da amiga e continuou. Helena gritou: vai quebrar!
Não demorou muito, o galho se rompeu arremessando Laura para longe aterrizando nos pés de uma laranjeira. As meninas largaram seus "namorados" e foram acudir Laura que estava toda desgrenhada com a cara pro chão. Helena passou a mão na sua cabeça perguntando:
- Laura, mulher, levanta daí! Você está bem?
- Acho que sim, tô toda ardida...
- Ah, do jeito que você estava parecia uma azeda. Eu avisei que ia quebrar - Lembrou Ana aos risos.
Laura levantou com o auxílio das amigas, com certa dificuldade, pois estavam todas passando mal de tantas risadas, inclusive a sem vergonha da Laura. Foram caminhando até a praça, aquela brincadeira já deu o que tinha que dar, e era melhor procurar outra. E depois do ocorrido elas decidiram que nunca mais namorariam com galhos de siriguela, eles não são confiáveis. Decidiram então que o próximo seria um pé de goibeira, aí sim, é bem resistente.

Na praça, sentada numa roda de amigas, Laura aconselhou: nunca namorem um galho de siriguela, eles te darão prazer, ouvirão suas faladorias, te farão promessas, mas no final irá te arremessar para bem longe e de preferência nos pés de uma laranjeira. Opte sempre por um pé de goiabeira, certo?